Estava nos degraus da casa da amiga esperando que o ônibus
que a traria do centro da cidade chegasse. Enquanto isso, dedicou um pouco mais
de seu tempo a escrita do caderno do qual aquela manhã encontrara bom uso.
Por muito tempo evitei escrever sobre...essa pessoa, sobre o que me faz
e me fez sentir sua simples existência. Havia uma espécie de admiração por ele
que fazia-me oculta-lo sob um véu de clandestinidade, e de proteção. Eu o
protegia, protegia o que éramos ou fazíamos. Só que hoje não há mais nada que
sustente essa antiga admiração. O que há é apenas desprezo e ódio, algo
corrosivo e que me consome num sentimento negativo que levou tudo o que poderia
sentir de bom embora. Não consigo mais ter nada de bom pela pessoa que me fez
sentir como eu me senti e ainda me sinto, então, aquela preocupação em
protege-lo esvaiu-se como se fossem cartas de um castelo que só agora me dava
conta do quão frágil e ilusório era.
Não
tenho mais motivo nenhum para esconder dentro de mim o que possivelmente pode
ser a chave para que eu me liberte deste demônio nostálgico, que me revira as
lembranças criando terríveis mosaicos oníricos. Escrever deve ser a única
solução. E falar talvez...
Ela termina a frase sem conclusão ao ouvir o estrondoso som
do circular que vem a toda descendo a ladeira que leva até o ponto de ônibus, em frente a casa na qual
aguarda. A amiga salta e se cumprimentam,
e enquanto destranca a porta e seguem para cima, ela pergunta como esta e
porque não parecia bem quando se falaram mais cedo pelo telefone. Sua boca coça
para contar sobre o sonho, mas se falasse teria de explicar muito mais coisas
do qual estava disposta. Olhou para o caderno em sua mão e o escondeu na bolsa
antes que também pudesse gerar perguntas. A verdade é que a escrita era uma
forma muito mais fácil de expor as coisas do que a fala. Com a escrita só
precisaria debater com si própria. Então, desta forma percebeu que ainda não
estava pronta para conversar com mais alguém sobre aquele caso. Inventou um
outro motivo banal de estresse para tirar seu sossego do dia e foram se
instalar na cozinha planejando algo para comerem.
***
2 comentários:
Você escreve muito bem, e o melhor, com alma!
Gostei! =)
Abraços.
Gosto de escrever com alma ;-). Que bom que curtiu, venha sempre! Bjos.
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