sábado, 30 de junho de 2012

O que restou do dia...





Um dia estranho esse, com mudanças bruscas de temperatura. Não apenas no clima. O inverno paulista é estranho, mas o inverno humano pode durar bem mais do que uma temporada. Pode durar até anos, talvez décadas. E eis que no rastro de um dia muito negro uma luz se insinua para mudar a paisagem e dar um pouco de paz. Sim, foi na decepção da recusa que algo de surpreendente aconteceu para mudar novamente a temperatura, deixá-la num tom ameno que há tempos não sentia.

Infelizmente, certos momentos de paz não são duradouros, e não tem força suficiente para iluminar certas escuridões. São lapsos, clarões momentâneos que nos despertam num momento oportunuo, nos livrando do torpor que nos levaria facilmente ao abismo. Mas não tem força para esquentar completamente aquilo que o dia petrificara numa forma cristalizada, cortante e fria. No regresso, a sensação era a de ir perdendo aos poucos aquela centelha de fogo, de tranquilidade, para o frio, para a noite, deixando-a cada vez menor e sem energia para continuar se nutrindo de nada, sendo que o que a fizera forte não existia fora daquela redoma das horas de paz que curiosamente encontrara enquanto não estava procurando por nada. 

Era como estar com um torrão de açúcar numa das mãos e desejar, ao atravessar a nado um rio, chegar com ele inteiro do outro lado. Quando se abre a mão ao final das braçadas, por mais que se desejasse cuidar com todo o esmero daquele cubinho de candura e esperasse que ele chegasse em sua forma e essência, nem que fosse pela metade, tudo o que sobra é uma mera sombra que não resistiu a correnteza. E nas pontas dos dedos sente-se apenas o gosto daquilo que fora. 

O frio volta e a escuridão novamente espreita pela janela como um demônio não exorcizado. Mas pelo menos já não olha por ela procurando o angulo certo para se jogar e sim, cerrando as cortinas e desejando que aquele vestigio da temperatura morna que lhe trouxe certa paz, ainda que tivesse perdido sua forma concreta, estivesse um pouco no ar, em sua pele, e pudesse lhe confortar até que o dia enfim amanhecesse.

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